Nota de Repúdio


NOTA DE REPÚDIO E ESCLARECIMENTO

O CEPEDES – Centro de Pesquisa em Direito e Segurança e seu coordenador, o pesquisador Fabricio Rebelo, foram alvo de uma suposta checagem de fatos empreendida pelo chamado “Projeto Comprova” e veiculada em diversos portais de conteúdo, a exemplo da Folha de S. Paulo, Estadão, Uol, Correio 24 Horas, dentre outros, rotulando o artigo “Homicídios com arma de fogo atingem menor nível desde 1999” como “enganoso”, o que é absolutamente falso.

De acordo com a "checagem" publicada, haveria um “erro de metodologia” na comparação evolutiva dos indicadores de homicídio, posto que utilizados os dados preliminares do DATASUS para o ano de 2019, quando os definitivos somente seriam publicados “dois anos depois” do ano de ocorrência, sendo os únicos legítimos para análise. Além disso, teceu-se crítica ao texto, por não considerar variantes dos índices de criminalidade homicida, vinculando-os, diretamente, à venda de armas.

Diante de tal quadro, assentado em flagrantes inverdades e manipulações, cumpre-nos repudiar veementemente tais assertivas, com o propósito de restabelecer a verdade dos fatos.

Inicialmente, é preciso considerar que o fato de se cuidar de dados preliminares é expressamente informado no texto, que em nenhuma passagem os toma como definitivos. A utilização de dados preliminares na pesquisa de criminalidade letal é, não só amplamente aceita, como natural para efetivos estudiosos da área, sendo, inclusive, legitimada pelo próprio DATASUS.

Em 2016, por exemplo, o IPEA e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, festejadas entidades na pesquisa de violência criminal, publicaram uma edição inteira da série "Atlas da Violência", sob o rótulo de “Nota Técnica”, analisando os indicadores preliminares de 2014, inclusive sob a coordenação do mesmo especialista ouvido na checagem e que, curiosamente, nela afirma não merecer crédito o pesquisador que utiliza tais dados (como ele próprio o fizera) – vide:
https://forumseguranca.org.br/storage/publicacoes/FBSP_Atlas_violencia_2016.pdf

Em 2020, uma nova edição do Atlas da Violência, também com a participação do mesmo pesquisador, voltou a utilizar dados preliminares - https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/24/atlas-da-violencia-2020.

O próprio portal oficial do DATASUS, sob o domínio eletrônico do Ministério da Saúde, registra que seus painéis de monitoramento são atualizados bimestralmente, com a publicação de dados definitivos “15 meses após o final do ano de ocorrência” (e não dois anos, como falsamente informa a "checagem"), esclarecendo que a versão preliminar é divulgada até “10 meses após o final do ano de ocorrência”, sendo expressamente ali tratada como “quase final”, apenas sob a orientação de que assim seja identificada em sua análise, diante da possibilidade de incremento residual – vide:
http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/index.php?area=0205&id=34340728.

E tais foram, exatamente, os procedimentos metodológicos adotados no artigo em comento, que identifica expressamente se tratar de dados preliminares e registra que, historicamente, a variação entre estes e os definitivos foi mínima.

De fato, nos anos de referência em que segmentamos diretamente tais indicadores (2014, 2015 e 2018), por exemplo, a variação média foi de apenas 1,48% (0,09%, 3,43% e 0,93%, respectivamente). Daí, inclusive, a reconhecida valia desse acompanhamento, reitere-se, apontado no próprio site do DATASUS como válido para cálculo de mortalidade geral, nos exatos seguintes termos: “este dado preliminar quase final também serve para cálculo de indicadores de mortalidade e natalidade, mas devem ser tomados como preliminares, pois podem ser incrementados de modo residual, o que contribui para a melhor qualidade do dado finalizado”.

Considerada essa variação histórica, não há absolutamente nenhuma "falha de metodologia" ou teor "enganoso" ao se afirmar que a queda de homicídios com arma de fogo é a maior já consignada. Aliás, como poderia ser um texto enganoso se as afirmações sobre sua fonte de dados estão expressamente nele registradas?

De outro lado, embora o dito projeto alegue verificar fatos, por ele nos foi direcionada uma crítica analítica pautada em opinião, em razão de não termos promovido uma análise social circunstanciada para explicar as causas para a variação negativa de homicídios. Isso, de fato,  por não consistir o objeto do artigo, propositalmente não foi feito, tendo em vista que nele não se buscou apontar causas para a mortalidade violenta, e sim, tão somente, registrar que seu decréscimo, em determinado período, foi acompanhado de um aumento na venda de armas, mas sem qualquer construção de relação causal.

O histórico do CEPEDES, inclusive, sempre foi o de refutar essa relação, desconstituindo a falácia que, esta sim, é inversamente defendida, com diversas entidades alardeando que mais armas implicariam mais crimes. O artigo apenas evidencia, com dados objetivos de fonte expressamente apontada, que isso é falso.

Ademais, impossível não notar a flagrante contradição contida na manifestação da entidade a que, ao contrário do havido conosco, se deu amplo espaço para, com opinião, rebater os números apontados no artigo. Se vem dela, historicamente, a defesa de que a associação entre armas e crimes é maléfica, com a elevação da circulação das primeiras resultando em mais mortes, como podem, agora que as variações foram discrepantes, afirmar que é um erro associar diretamente os dois fatores? Isso só comprova que não se trata de checagem alguma de fatos, mas de construção de narrativa.

Portanto, diante do leviano tratamento dispensado ao material que publicamos, com impacto indubitavelmente depreciativo em nossa imagem, sobretudo perante parceiros e alunos, registramos a presente nota de repúdio e esclarecimento, para o restabelecimento da verdade dos fatos, desde já pugnando por sua ampla divulgação, inclusive para fins de eventual retratação pública pelos responsáveis pelo material, sem prejuízo da adoção das medidas judiciais legalmente exigidas pelo caso, especialmente diante dos danos sofridos e de sua necessidade de reparação.

Salvador / BA, 29 de setembro de 2020.

(atualizado em novembro de 2020)


CEPEDES – Centro de Pesquisa em Direito e Segurança 
Fabricio Rebelo – Coordenador
Data Atual: